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Mulheres Protagonistas: a luta pela redistribuição e pelo reconhecimento

Em um auditório lotado com mais de 200 pessoas (sentadas, em pé, no chão...), Lídice Guerrieiro e Mariana Vedder iniciaram o “I Ciclo de Atividades no Mês das Mulheres”, organizado pelo Laboratório Interdisciplinar de Estudos de Gênero e Sexualidade - LIEGS e Grupo de Pesquisa Imagens do Feminino do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro - IFRJ, com a palestra – que tomou ares de bate-papo informal – “Protagonismo das Mulheres na Atualidade”, no dia 8 de março de 2016, marcando o Dia Internacional da Mulher. Além das duas palestrantes, a mesa foi composta pelas professoras Mariana Maior e Luciana Reis.

Lídice, que é doutoranda da Uerj e professora da Rede Estadual de Ensino, iniciou a palestra e a sua fala dizendo que “trabalhar com jovens é um exercício de autocrítica diário”. Além disso, falou sobre a falta de exemplos de mulheres condutoras de conhecimento apresentadas em sala de aula, e sobre assédios já sofridos ou vistos em ambiente escolar (como de um professor – para com ela – e de policiais, que são “inspetores” em alguns colégios da rede estadual – para com alunas).

Analisando o significado da palavra protagonismo, que vem do grego protos – primeiro, principal / agonista – lutador, agente, Lídice continuou sua fala, dizendo que a mulher como protagonista ainda choca a sociedade; por isso, a luta da mulher é uma luta por redistribuição [de protagonismo] e por reconhecimento [mulher reconhecida além dos padrões estéticos de beleza].

Para Lídice, a educação das Ciências Humanas nas escolas técnicas é capaz de superar o senso comum. Sendo a expressão “tecnológica” tão vinculada ao gênero masculino – já que muitas vezes tem atrelada à sua significação a organização dos laboratórios, o armazenamento de equipamentos posicionados muito alto (já que a média de altura feminina é mais baixa do que a masculina), registros fechados com tanta força que somente homens “dão conta”, peso de artefatos, obstáculos que exigem o uso de força bruta, etc –, a contribuição da Sociologia e das Ciências Humanas no ensino técnico seria necessária para a desnaturalização das relações de poder na área, aumentando a visibilidade feminina na educação tecnológica.

Porém, os conhecimentos científicos ensinados nas escolas, são feitos majoritariamente por homens da elite. Desta forma, Lídice finaliza seu momento de fala dizendo: “eu acredito numa outra episteme [...] que valorize a mulher como sujeito do conhecimento”, em uma incrível reflexão sobre a necessidade das ciências humanas na escola (que é um espaço de poder e de produção do conhecimento) e, mais ainda, das ciências humanas produzidas por mulheres, na valorização do protagonismo feminino na sociedade.

Mariana Vedder, doutoranda em Ciências Sociais na PUC-Rio e autora da dissertação “My pussy é o poder”, ao início de sua fala, refletiu sobre o contexto atual, com o protagonismo feminino sendo amplamente discutido na internet e nas redes sociais, numa comparação com a sua época de adolescência, quando isso não ocorria. Disse ainda que os feminismos são muitas vezes “demonizados”, assim como os direitos humanos, e marginalizados pela sociedade.

A falta de protagonismo feminino na sociedade, segundo a doutoranda, ainda é muito reforçada pelo tratamento dado às mulheres sempre de “acompanhantes’, nunca sujeitos de sua própria vida. “Perdeu a virgindade”, “fulana é a mulher de ciclano”, dentre outras falas costumeiramente reproduzidas, apenas traduzem o papel da mulher de acompanhante e não de protagonista. Essa fala reforçou a fala anterior de Lídice, de que a luta feminina é por redistribuição de protagonismo e reconhecimento de sua capacidade.

Mariana, dentre outros assuntos abordados (como o silenciamento da escola em relação à temas sobre diversidade sexual, direitos reprodutivos e libertação sexual feminina, além da questão do aborto como tabu na sociedade e nos projetos políticos), discorreu sobre sua tese de mestrado (“My pussy é o poder”), onde estudou o protagonismo atual das mulheres no funk. Segundo ela, as mulheres que determinam o que querem no sexo, que cantam e vestem o que querem, rompem com a barreira da obviedade e do esperado, e trazem uma nova concepção do que é ser mulher. Mesmo que ainda assim continuem se encaixando nos padrões de beleza pré-determinados, pois, se não se encaixam neles, tem sua feminilidade excluída.

Dando prosseguimento a sua fala, Mariana perguntou ao auditório lotado quem ali se considerava feminista. Mãos ao alto, mas que não representavam nem metade do público, no que a palestrante disse ser um número relevante, mas ainda ser pouco. Falou então sobre uma das mais importantes lutas feministas, a luta do sufrágio (direito ao voto), citando inclusive o filme lançado no fim de 2015 “Sufragistas”. Ainda sobre o assunto, disse que o Brasil foi um dos primeiros países a aprovar o voto feminino, mas que hoje em dia, frente a 60% da população feminina do país, apenas 10% do parlamento é composto por mulheres. Isso porque não se tem incentivo desde cedo para que as meninas almejem altos cargos, sejam políticas, acadêmicas, empresárias; e esse incentivo, quando existente, não é reforçado pela falta de representatividade (vide a política).

Finalizando a fala das palestrantes, para que fosse dado o prosseguimento às perguntas do público presente, a autora de “My pussy é o poder” disse: “O quadro é desanimador, mas esse quadro aqui [referência ao auditório lotado] não é não”.

No momento de abertura para o público, Mariana iniciou respondendo às perguntas levantadas. Acerca dos conflitos dentro do feminismo, Mariana disse que os enfrentou enquanto fazia sua dissertação, uma certa repressão pelo tema abordado de mulheres amigas. Disse ainda que é importante que haja divergências no movimento feminista, e que todas deveriam ser encaradas com naturalidade. Sobre o aborto, em uma outra questão, Mariana falou sobre a facilidade de implementação do aborto seguro na saúde pública brasileira e que este deve ser legalizado. Em uma questão sobre a participação masculina no movimento feminista, ela disse não discordar de homens no movimento, mas o que realmente importa são as atitudes tomadas por eles, e não a sua classificação como “feministos” ou não. Entrando numa pauta atual, e encerrando sua participação no evento, Mariana respondeu sobre o possível candidato à prefeitura do Rio de Janeiro, Pedro Paulo – acusado de agressão contra sua ex-mulher – e também sobre Sara Winter – que se intitula ex-feminista (foi integrante do grupo femista feminista radical fêmen) e apoiadora do deputado federal Jair Bolsonaro. Sobre Pedro Paulo, a palestrante só disse que espera ver nas urnas a reação contra ele, e sobre Sara Winter, que ela lhe parece uma pessoa confusa.

Com a palavra passada para Lídice, em uma pergunta sobre o tal “professor galanteador” citado no início de sua fala, a professora disse que quer mais do que um elogio da parte dele, quer companheirismo para continuar lutando. Em um exemplo de machismo enraizado na educação, Lídice contou que para cada aluna grávida, a escola perde pontos na bonificação da SEEDUC, e deixou a seguinte reflexão para o público: “e para cada aluno que engravida alguém, a escola também perde pontos?”. A palestrante falou ainda sobre o silêncio da escola em casos de agressão contra alunas, professoras ou servidoras. Entrando no assunto Pedro Paulo, disse que neste caso é explícita a relativização da violência, onde, ainda que um homem tenha agredido uma mulher, não se privam dele os direitos políticos e o apoio de outros homens para tal. Sobre o protagonismo feminino, Lídice citou a “esposa de Lavoisier”, que em centenas de anos de história continua sendo uma especie de anexo de seu marido, sem nome. Finalizando sua participação no primeiro evento do Ciclo de Atividades, a palestrante reforçou o espaço de fala das mulheres nos movimentos sociais como de extrema importância para que as mudanças ocorram.

No momento final da atividade, em uma parceria com o professor de Inglês, Thiago Ponce, foi realizado um sarau, com trechos de livros e poesias escritos por mulheres sendo recitados por alunas do IFRJ e do CEFET-RJ, encerrando a abertura do “I Ciclo de Atividades no Mês das Mulheres” com emponderamento feminino através da literatura.

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